Conjecturando, (ou, com jeito, urrando)... rescisões atabalhoadas na Função Pública.
Este governo, que ficará pela
negativa na memória do povo, conseguiu parte dos seus intentos na desestabilização
social. Baseado em algumas diferenças, conseguiu mover a maioria dos
trabalhadores do privado contra o público e vice versa. Obviamente, tratando-se
de um elenco da ceguíssima ala neoliberal, nada nos admira que subvalorize todo
o operariado e que subverta o papel do funcionário público, no entanto, tal
facto não lhe concede a liberdade de destruir todo um sistema de utilidade pública, em nome de uma falsa e
fraudulenta reforma da administração pública, para a qual não foi mandatado.
Age de forma selectiva, baseado, maioritariamente, na conotação e persecução políticas,
com as novas rescisões de funcionários públicos, numa altura em que a maioria se
encontra em gozo de férias e se irá esbarrar numa carta “informativa”, de
rescisão “amigável”, já “continhas feitas”, na sua caixa de correio. Trata-se
apenas de “informação”, disse o lingrinhas do “poio” Maduro, com sua inimitável
voz de cascavel enjoada, contudo, na realidade, nem todos os funcionários
públicos receberam a “carta informativa”. Logo, existe tratamento diferente
para os vários funcionários das várias instituições. Informação dos directores
dessas instituições? Então estes, na sua maioria nomeados pela cor política
vigente, acabaram por indicar quais os que deveriam receber a dita carta. Que
os moveu? Deduzam que não se enganam muito.
E se o trabalhador não aceitar a
proposta da “carta informativa”, por razões pessoais, familiares ou outras? Vai
para requalificação ou mobilidade? Uma coisa é certa, ficará sob o “olhar
atento” do chefe ou director, à espera da primeira “oportunidade” de
despedimento e até entretido, em qualquer canto do gabinete a contar as moscas
e a ver quem entra ou sai. Depois...se verá que fazer com o estorvalho!
Será que isto já faz parte de uma
reforma da administração pública que nem sequer foi definida, mas se vai
desenrolando, “ad libitum”, sem qualquer linha organizativa ou fruto de alguma
legislação existente? Como alguém bem referiu, trata-se de construir um
edifício começando pelo telhado.
Muitos questionam: e os
excedentários das forças militares, que ganham bastante e não fazem falta ao sistema
actual, porventura terão recebido iguais “cartas informativas”? Claro que os
governantes têm medo destes e receiam atitudes mais violentas, apesar de pouco
plausíveis. E os “chefes” e “directores” de má qualidade e com maus resultados
de gestão, não mereceriam uma destas “cartas informativas” de rescisão? E que
tal as pessoas começarem todas a enviar “cartas informativas” a todos os
ministros e seus acólitos, comunicando-lhes que deveriam ser demitidos a custo
zero, por não desempenharem as suas funções de acordo com a constituição e com
o que prometeram nos seus programas eleitorais. O incumprimento tornou ilegítima
a sua governação, pelo que deverão rescindir o contrato com o povo.
Brevemente teremos a verdadeira
explicação de toda esta salgalhada. O governo despede os funcionários públicos
e depois vai substitui-los por novos funcionários, mas já a contrato individual
e a baixo preço, sem direitos decentes e sujeitos a leis laborais mais
permissivas. Até irá subcontratar empresas privadas, como já faz em cantinas,
limpesas e outros, de forma a empobrecer o estado e enriquecer empresários
amigos. É que, segundo as suas teorias neoliberais, uma mesma gestão é
diferente se for privada ou pública, mesmo feita pelos mesmos agentes. Claro
que se houver saldo positivo o lucro é para o empresário, mas no público o
lucro é distribuido por todo o povo (que, por tão diluido, nem o vê, nem recebe).
Mais vale o lucro para meia dúzia de accionistas privados, que para o serviço e
benefício de toda uma população. Enfim, teorias para povo mal informado e bem
explorado.
(imagem da net)
(imagem da net)
Não era minha pretensão voltar ao
tema da falsa guerrilha entre público e privado, no entanto, sem pretender
diferenciar ou estigmatizar trabalhadores privados ou públicos, ficam, como
remate, algumas questões que gostaria me respondessem, com lógica baseada na
evidência: conhecem algum funcionário público, sério e vivendo apenas da sua
remuneração como tal, que esteja na lista das maiores fortunas de Portugal?
Já nem me atrevo questionar
quantos funcionários públicos, nestas circunstâncias, terão iates ou moradias
de luxo (nas zonas de Sintra, Cascais, etc.) e vivendas de luxo para veraneio?
E porque será? Guardam o dinheiro em offshores ou gastam-no mal gasto? Às
tantas é para “brincar aos pobrezinhos”!
Claro que esta questão se colocará
em relação aos operários por conta de outrem, que vivem do seu salário e
contribuem para enriquecimento descarado de alguns empresários. Simplesmente o
seu patrão não é o Estado, que é mal gerido por oportunistas políticos e seus
correligionários, à espera de um melhor futuro em empresas privatizadas ou “agremiações
de malfeitores sociais”.
Na sua generalidade, quem explora
a economia paralela e foge literalmente aos impostos, os privados ou os
funcionários públicos? Estes descontam impostos de imediato nas remunerações,
daí terem ficado automaticamente com cortes remuneratórios desde Janeiro de 2011 (o que não sucedeu aos
privados)... e que são para manter “ad eternum”, enquanto não pagarmos os
buracos dos BPN, BPP, submarinos, swaps e quejandos.
Como exercício de diversão peço,
como exemplo, que analisem e comparem as remunerações finais de um médico da
função pública e doutro da privada, que ganhem, por exemplo, 5.000 euros
mensais (um belíssimo ordenado, mas nada comparável com a reforma mensal do
“pobre” Faria de Oliveira). A diferença é abismal! Os privados não têm corte de
10%, nem descontam para a ADSE (ou outro sistema de saúde estatal) e, muitas
vezes, têm prémios de assiduidade e produtividade (nada pequenos). Ambos
descontam para a sustentabilidade, um para o Centro Nacional de Pensões (11%) e
outro para a Caixa Geral de Aposentações ( 11%). Mas como vêem só o funcionário
público desconta para o sistema de saúde (2,25% que a partir de Janeiro/14
passarão a 2,50%).
Enquanto o público recebe menos
de 2500 euros ao fim do mês, o da privada receberá mais de 3250 fora os prémios
que os outros vêem por um canudo.
Dirão que o privado trabalha 40
horas, mas não sabem que as remunerações médicas elevadas da função pública são
pagas a profissionais em exclusividade, com horário obrigatório de 42 horas. Os
médicos que trabalham 35 horas (não exclusividade) só em topo de carreira
(assistente hospitalar sénior) e tarde, ganharão valor igual ou maior que 5.000
euros. Brevemente os médicos reformados irão sofrer pela mesma tabela,
mantendo-se a diferenciação público/privado, se os cortes a pensionistas for
avante.
Também posso dizer que só médicos
mais velhos estão na função pública, pois os mais novos já têm contratos
individuais de trabalho, com regras iguais às do sistema privado, mesmo nos
descontos, férias e horário laboral. Contudo, como são pagos pelo Estado, sofrem
os cortes remuneratórios da função pública.
Eu próprio, como muitos médicos
mais velhos, estou desde 2010 em regime de contrato individual de trabalho, com
40 horas de trabalho semanal e 22 dias de férias, sob as mesmas regras do
privado, mas com descontos de funções públicas, ou seja, bem roubado. Trabalho
há mais de 35 anos.
Finalizo, dizendo: não me queixo,
pois teria vergonha de o fazer e sentir-me-ia muito mal face a tanta gente que
vive em condições infra-humanas.
Queria ainda acrescentar que esta
miserabilização do funcionalismo público interessa sobretudo a muitos
empresários que têm assim um motivo para manter exploração de trabalhadores
privados e até conseguirem baixar mais as remunerações. Só não vê quem não quer
ver. A verdadeira guerra, público versus privado, não passará de manobra de
diversão política e empresarial.
Comentários
Verdades como punhos.
P.Rufino