Medicamentos de venda livre...lobbies e deontologia

Não me tinha ainda debruçado sobre o cada vez mais polémico negócio dos fármacos de venda livre que muito irrita certos lobbies, como não poderia deixar de ser, já que a negociata implicará perda de valores para muitos farmacêuticos com lojas fortes e até múltiplas, além de lhes cercear o exclusivo monopólio de fornecimento, ao público, de enorme fatia de medicamentos. Creio que quem pode vender nas farmácias produtos não farmacológicos, como champôs, chupetas, fraldas, leites, cremes de beleza, etc., deverá aceitar que, nos estabelecimentos comerciais destes e doutros produtos similares, se comercializem também medicamentos de venda livre.
Poderá caber-lhes razão na não aceitação de uma autêntica balda, na forma de venda desses medicamentos, ou seja, distribuição "ad libitum", sem supervisão de perito conhecedor de eficácia e risco dos fármacos vendáveis, e até no tipo de armazenamento e local do mesmo. Creio que poderá ser um erro tremendo manter certos medicamentos, hoje de venda livre, em estantes de acesso fácil, ao alcance das mãos de crianças e certas pessoas menos informadas, tendo em conta que a grande maioria desses fármacos não podem ser considerados inócuos e até são perigosos se usados desmedida e irracionalcionalmente. A maioria das pessoas desconhece, como exemplo de produto de venda livre, que a vulgar "ASPIRINA", no mercado há mais de cem anos, se for ingerida sem alimentos no estômago pode provocar uma úlcera e levar até à morte, para já não falar das frequentes e graves alergias a este mesmo produto. Portanto...que se cuidem os incautos.
Assim, entendo que alguém que domine a farmacologia deverá estar subjacente a tais vendas, em áreas que não farmácias. Os fármacos deverão estar em secções estanques, bem acondicionados e acessíveis apenas a funcionários apropriados e sob orientação de responsável conhecedor dos mesmos produtos.
E porquê alguém conhecedor dos efeitos e riscos decorrentes do uso inapropriado do medicamento? Pelo simples facto de que se um cliente não necessita de receita médica para aquisição desse produto, deverá sempre ser informado dos tais riscos por alguém capaz de lhe fornecer a informação que não teve, por omissão de clínico prescritor.
Aqui entramos noutro aspecto que nunca vi debatido pelos media. Só os farmacêuticos é que podem informar os clientes acerca do fármaco a adquirir? Não sei se para além de médicos e farmacêuticos, mais alguém recebe ensinamentos científicos consistentes sobre Farmacologia e Terapêutica, pelo que entendo, que nas áreas de venda livre, os responsáveis técnicos sejam os licenciados em Farmácia. No entanto, e aqui é que reside a minha opinião que ainda não vi debatida, porque não poderá existir nos próprios consultórios médicos, por absurdo que pareça e até pouco deontológico, uma secção de venda desses produtos? Poderá essa área nem sequer ser pertença ou exploração do mesmo médico que ali consulta. E se for, não estará o médico acima de qualquer suspeita técnico-científica de conhecedor dos produtos, das suas indicações e efeitos colaterais? Mesmo que o doente não vá à consulta desse médico, despesa que evita, poderá entrar na área anexa de comercialização, e se necessário poderá ter informação fidedigna imediata, mesmo ali ao lado. Também os doentes consultados e com prescrições desses fármacos de venda livre poderiam, logo ali, adquirir esses produtos, possivelmente a preços mais baixos. Seria de repensar, sem pruridos, esta questão, embora saiba que iria estalar uma autêntica guerra com farmacêuticos mais renitentes, ir-se-ia apelar à deontologia profissional, e acima de tudo iriam apodar os médicos de monopolistas. Mas vejam bem que se trataria apenas de venda de produtos medicinais de venda livre, e não de toda a restante farmacopeia que na realidade acho que apenas deverá ser vendida em farmácias convencionais. Além de mais a exploração dessa secção poderia, como disse, pertencer a outra pessoa que não o médico, ou médicos, que ali exerçam.
Importante e muito benéfico para os doentes seria também abrir, como já se pensou, as farmácias hospitalares a todos os doentes dessas áreas de referência, pois seria certamente uma forma de tornar mais baratos os medicamentos que, como sabemos, são parte onerosa de muitos orçamentos familiares, essencialmente dos idosos e doentes crónicos. Se os funcionários fossem poucos na farmácia hospitalar, até seria motivo para criação de novo emprego.
Não queria deixar de acrescentar, como opinião própria e correlacionada com o assunto, que qualquer diplomado em Farmácia, deveria ser autorizado a abrir o seu estabelecimento farmacêutico onde quisesse, sem limitações por área e habitantes, tal como os médicos abrem consultórios onde e quando o pretendam. A lei vigente sob aquisição de farmácias é que favorece parte de uma classe, a dos farmacêuticos, mas prejudica os jovens licenciados que terão de optar por outras áreas farmacológicas, como a laboratorial, ou então viram autênticos empregados de promotores de lobbies e de um verdadeiro monopólio.
Espero que a nova regulamentação para venda desses produtos não vá causar mais danos que os já existentes.

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